Em pouco menos de cem dias, o eleitor gaúcho vai decidir o governador que vai administrar o Estado a partir de 2023. A disputa ainda está em aberto, com onze pré-candidatos de variadas orientações políticas e ideológicas. No entanto, independentemente de quem será o nome à frente do Piratini, algumas definições já estão dadas.
O acordo permite ao Estado a renegociação da dívida com a União, em 30 anos. No entanto, impõe uma série de restrições aos próximos governadores.
Independentemente do projeto que sair vencedor no pleito de outubro, a capacidade de administrar do futuro governador gaúcho estará limitada pelos termos do acordo firmado pelo atual governo, e que vem sendo negociado desde 2017, passando pelos governadores José Ivo Sartori, Eduardo Leite e Ranolfo Vieira Júnior.
Três semanas se passaram entre a aprovação do plano estadual e a homologação pelo presidente da República. Nos bastidores, se especulou que a demora fosse motivada por pressão do ex-ministro e pré-candidato a governador Onyx Lorenzoni, aliado de Bolsonaro. Lorenzoni, que é contrário ao acordo, nega interferência.
Criado pelo governo federal em 2017, o Regime de Recuperação Fiscal é uma forma de fazer com que os Estados em pior situação fiscal sanem suas finanças. O RS é o segundo Estado a firmar o acordo. O primeiro foi Goiás.
A adesão permite ao Rio Grande do Sul a renegociação da dívida com a União, com pagamento em trinta anos, com parcelas progressivas, que começam em R$ 400 milhões anuais, em 2023, chegando a R$ 4 bilhões a partir do nono ano. Com isso, de acordo com a Secretaria da Fazenda, a dívida estará quitada em 2052.
O acordo possibilita ao Estado contratar operações de crédito com a anuência de Brasília como, por exemplo, um empréstimo junto ao BID para pagamento de precatórios.
Na avaliação do Sindicato dos Servidores de Nível Superior do Poder Executivo do Estado do RS (Sintergs), o Regime de Recuperação Fiscal condena o Estado à impossibilidade de investimento e crescimento.
"Ataca de morte no pacto federativo. Tivemos um acordo mal construído na década de 1990 e mais uma vez algo semelhante é apresentado como única solução", afirma o presidente do Sintergs, Antônio Augusto Medeiros.
Para Medeiros, as restrições a contratações e mudanças na carreira dos servidores deverão afetar a prestação de serviço à população, principalmente nas áreas de Educação, Saúde e Pesquisa. O Sintergs defende que o Piratini cobre do governo federal a auditoria da dívida e revisão dos valores.
"O próximos governadores e secretários da Fazenda não terão a condição de gerir economicamente o Estado. Terão que ter a anuência deste grupo que está instituído. É assustadora a submissão que o governo do RS coloca o Estado, uma postura que é contrária inclusive à nossa história e à defesa do pacto federativo", afirma.
Os auditores fiscais do Estado acreditam que, em uma eventual mudança de governos nas eleições de outubro, seja possível revisar o saldo da dívida.
"A partir da readequação do saldo, será possível fazer frente ao problema, através do investimento na receita do Estado, aprimorando a modernização dos processos de trabalho, repondo as vagas abertas no quadro dos auditores fiscais", afirma o presidente do Sindifisco RS, Altemir Feltrin.
Ele explica que o acordo de 1998, época do governo de Antônio Britto, previa a revisão do valor com base no IGP-DI. A partir do ano seguinte, sobreveio uma forte crise cambial, com forte impacto neste índice, que cresceu de forma descolada da inflação medida pelo IPCA. Isso fez com que a dívida, que era de R$ 9 bilhões na época, crescesse. Para Feltrin, o acordo feito pelo governo gaúcho com o federal torna a dívida impagável.
"Entendemos que este problema deveria ser apurado, pois representa um montante expressivo do saldo, que hoje está na casa dos R$ 74 bilhões. No RRF, o Estado ficará sem pagar o valor equivalente a R$ 4 bilhões por ano e esse valor vai se acumular no saldo. Ou seja, será impagável após o término do RRF, após 2030."