
Cinema teve duas grandes perdas no fim de semana
Vittorio, dos Irmãos Taviani, e Milos Forman estão entre os cineastas mais importantes da história do cinema. André Moraes
Um dos episódios do filme Maravilhoso Boccaccio (2015), dos irmãos Taviani, baseado no clássico Decameron
No sábado, morreu Milos Forman, cineasta de origem checa que fez carreira no circuito anglo-saxônico. Forman dirigiu o oscarizado Amadeus (1984) e também assinou outras pérolas como Um Estranho no Ninho (1975) e Hair (1979).
Neste domingo, morreu Vittorio Taviani, um dos irmãos Taviani, dupla de cineastas italianos que assinou, entre outros, Kaos (1984), A Noite de São Lourenço (1982), Bom Dia Babilônia (1987) e, mais recentemente, Maravilhoso Boccaccio (2015).
A dupla de cineastas Irmãos Taviani. À esquerda, Vittorio e à direita Paolo.
São cineastas que foram mundialmente saudados, acumulando prêmios como Cannes e o Oscar. Acima de tudo, nos dois casos trata-se de diretores que souberam com maestria mesclar os elementos envolvidos na sétima arte, como o desempenho de atores, as boas histórias e as narrativas visualmente bem resolvidas. Curiosamente, também, trata-se nos dois casos de cineastas caracterizados pela sensibilidade e pelos valores humanistas.
Aproveite para correr atrás de alguns desses títulos, se você não viu.
Uma Dobra no Tempo é malogro espetacular da Disney
Superprodução com Oprah Winfrey e Cris Pine é mais um dos bizarros fracassos de público e crítica do estúdio Disney. André Moraes
Oprah Winfrey em cena da produção da Disney Uma Dobra no Tempo
Embora a Disney seja um império multimídia, a estas alturas dona da Marvel, da Pixar e de parte da Fox, é curioso que as produções de cinema com a própria marca do estúdio frequentemente são fracassos de público e crítica. Este é um destes casos.
O elenco estelar inclui Chris Pine, Oprah Winfrey (foto) e Reese Witherspoon, mas Uma dobra no tempo sofre de vários problemas, desde o figurino cafona até o tom que não se acerta entre o infantil e o adulto. Algumas cenas são inadequadas para crianças, pela tensão ou chatice, e outras são difíceis de aguentar para os pais – problema da Disney já visto em Tomorrowland. O filme se esforça tanto para ser politicamente correto e agradar toda a família que termina sendo um porre para todo mundo, apesar da premissa de fantasia e aventura.
Tá. Isso quer dizer que o filme é ruim e que você não deve assistir? Não, muito pelo contrário. É tão ruim que chega a ser imperdível. Espetacularmente desastroso, tanto em desempenhos quanto direção e roteiro, Uma Dobra no tempo é a 5a Sinfonia dos filmes ruins. Não deixe de ver. Mesmo em Hollywood fazem poucos desses.
Jogador Número 1 é decepcionante
Novo filme de ação de Steven Spielberg parece adaptação feita às pressas do best-seller de ficção científica homônimo. André Moraes
Imagem de divulgação do filme Jogador no. 1, de Steven Spielberg
A história é ambientada em 2044, quando o mundo passou por várias crises econômicas que produziram vastos cinturões de pobreza e desemprego. O herói mora nos stacks ("pilhas"), grandes favelas verticais feitas de trailers e containers empilhados. Neste cotidiano sombrio e sem muitas perspectivas, a maior parte das pessoas passa seu tempo em uma plataforma de realidade virtual compartilhada, o Oasis. Quando o criador do jogo, um nerdão recluso, morre, ele lança um desafio. O primeiro que encontrar um easter egg (uma surpresa) que ele deixou escondido dentro do game vai herdar seu império. É nesta corrida que o jovem herói vai entrar, junto com alguns amigos e tendo de enfrentar uma megacorporação maléfica interessada em ganhar o controle do Oasis mesmo que tenha que trapacear ou matar.
Ilustração de capa de uma das edições norte-americanas de Ready Player One
O livro de Ernest Cline, sem ser propriamente uma obra-prima, tinha principalmente o charme das referências pop. Dentro da história, o criador do game era fissurado nos anos 70 e 80, época de sua infância e juventude, e por conta disso tinha escondido seu easter egg em uma trilha de pistas que faziam maciçamente referências a filmes, livros, games e músicas daquele período. Boa parte do livro trazia os heróis discutindo obscuridades do pop nostalgia, de games da Atari a seriados japoneses. O livro era uma espécie de Código Da Vinci para nerds.
Embora use várias referências, o filme de Spielberg não se aprofunda no complexo sistema de pistas e enigmas que envolve o jogo disputado pelos heróis e bandidos, nem traz algumas das cenas mais divertidas. Muitas coisas são substituídas para efeito gráfico, como o primeiro enigma, que no livro era toda uma série de pistas e desafios mas na telona vira basicamente um game gigante de corrida.
Vários pontos essenciais da trama têm equivalência, mas o filme termina ficando meio sem graça, simplificando tanto o sistema de referências quanto os relacionamentos entre os heróis. Até o vilão Sorrento fica empobrecido na tela, reduzido de um nerd do mal para um executivo sem escrúpulos.
Uma das cenas de Jogador Número 1 ambientadas em realidade virtual. Nestas sequências o filme lembra uma animação
Outra explicação para o enxugamento de referências pop na telona é a questão de direitos autorais. O escritor Ernest Cline pode ter conseguido licenciar citações e uso de marcas para usar no livro por pouco dinheiro, mas certamente um estúdio de cinema não ganharia esta barbada em uma superprodução. Por conta disso, muita coisa ficou de fora, como uma participação de Ultraman, vários games e também sequências inteiras de filmes como Monty Python e o Santo Graal ou War Games.
Embora quem veja o filme só pelo filme possa até curtir, os fãs do livro provavelmente vão ficar desapontados. Spielberg, obviamente, sempre é Spielberg, e a trama é bem narrada, com fotografia ótima e belas imagens. Mas não foi dessa vez que Hollywood nos brindou com uma superprodução feita para nerds.